Monday, July 23, 2007

Richard Bach


Fernão Gaivota passou o resto dos seus dias sozinho, mas voou muito além dos Penhascos Longínquos. A solidão não o entristecia. Aprendia cada vez mais. Aprendeu que um eficiente mergulho a grande velocidade lhe dava o peixe raro e saboroso que vivia três metros abaixo da superfície do mar. Já não precisava de barcos de pesca nem de pão duro para viver. Aprendeu a dormir no ar, estabelecendo um percurso noturno pelo vento do largo, cobrindo cento e cinqüenta quilômetros desde o ocaso até a aurora. Utilizando o mesmo controle interior, voou através de nevoeiros cerrados e subiu acima deles para céus mais claros e resplandescentes... Enquanto as outras gaivotas ficavam em terra, conhecendo apenas a neblina e a chuva.
Fernão Capelo Gaivota

Saturday, July 21, 2007

GANYMEDES JOSE

Dialogar é mais do que isso, Flávia... dialogar é a gente conversar com os olhos, com o coração. Aí, quando chega o momento certo, é que sabemos se o diálogo funcionou. Seu diálogo com a sua filha não funcionou. Alguma coisa está errada! Não sei de quem é a culpa. Pode até nem haver culpa. Mas não será com essa sua atitude radical que você conseguirá segurar o amor e o respeito de Lília!


A LADEIRA DA SAUDADE

NELSON RODRIGUES


VOZ DE ALAÍDE (microfone) - Eu sou muito mais mulher do que você - sempre fui!
LÚCIA (noutra atitude) - Foi você quem perdeu minha alma!
PEDRO (rápido) - E você a minha!
LÚCIA (sardônica) - Você nunca prestou! Foi sempre isso! Não me olhe, que não adianta!
PEDRO - Está bem. Depois eu falo com você.
LÚCIA - É inútil. Não serei de você, nem de ninguém. Você nunca me tocará, Pedro.
PEDRO - Você diz isso agora!
LÚCIA - Jurei que nem um médico veria o meu corpo.
PEDRO (cruel) - Então ela ficou impressionadíssima com as mulheres vestidas de amarelo e cor-de-rosa. Uma vitrola! Duas fulanas dançando!
LÚCIA (chorosa) - Não fale assim! Ela está ali. Morreu.
PEDRO (sardônico) - Era louca por toda mulher que não prestava. Vivia me falando em Clessi. Uma desequilibrada!
LÚCIA (revoltada) - Você deve estar bêbedo para falar assim!
PEDRO (sério) - Ou louco... (grave) Não tenho o menor medo da loucura.



Vestido de Noiva

Friday, July 20, 2007

FERNANDO PESSOA


Talvez se descubra que aquilo a que chamamos Deus, e que tão patentemente está em outro plano que não a lógica e a realidade espacial e temporal, é um nosso modo de existência, uma sensação de nós em outra dimensão do ser. Isto não me parece impossível. Os sonhos também serão talvez ou ainda outra dimensão em que vivemos, ou um cruzamento de duas dimensões; como um corpo vive na altura, na largura e no comprimento, os nossos sonhos, quem sabe, viverão no ideal, no eu e no espaço. No espaço pela sua representação visível; no ideal pela sua apresentação de outro género que a da matéria; no eu pela sua íntima dimensão de nossos. O próprio Eu, o de cada um de nós, é talvez uma dimensão divina. Tudo isto é complexo e a seu tempo, sem dúvida, será determinado. Os sonhadores actuais são talvez os grandes precursores da ciência final do futuro.


LIVRO DO DESASSOSSEGO

Gabriel Garcia Marquez

Então deu outro salto para se antecipar às predições e averiguar a data e as circunstâncias da sua morte. Entretanto antes de chegar ao verso final já tinha compreendido que não sairia nunca mais daquele quarto, pois estava previsto que a cidade dos espelhos ( ou das miragens ) seria arrasada pelo vento e desterrada da memória dos homens no instante em que Aureliano Babilonia acabasse de decifrar os pergaminhos e que tudo que estava escrito neles era irrepetível desde sempre, e por todo o sempre, porque as estirpes condenadas a cem anos de solidão não tinham uma segunda chance sobre a terra.
Cem anos de Solidão

ERICO VERÍSSIMO

Eugenio olhou em torno do quarto. Olívia estava presente ‑ ele sentia ‑ naqueles móveis, naqueles objetos, no perfume que andava no ar. Estava presente nas suas cartas, no próprio brilho das estrelas e também na alma e no sangue de Ana Maria. Mas dentro de algum tempo ‑ sentia Eugenio dolorosamente ‑ ela seria apenas um símbolo, um nome sem corpo, um rosto sem feições. Foi deitar‑se impressionado. E naquela noite, sonhou que Olívia tinha sido apenas um sonho em sua vida.

OLHAI OS LÍRIOS DO CAMPO

CLARICE LISPECTOR


Há uma hora em que se deve esquecer a própria compreensão humana e tomar um partido, mesmo errado, pela vítima, e um partido, mesmo errado, contra o inimigo. E tornar-se primário a ponto de dividir as pessoas em boas e más. A hora da sobrevivência é aquela em que a crueldade de quem é vítima é permitida, a crueldade e a revolta.

É preciso também não perdoar


Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim.


Felicidade Clandestina


Meu Deus do céu, não tenho nada a dizer. O som de minha máquina é macio. Que é que eu posso escrever. Como recomeçar a anotar frases? A palavra é o meu meio de comunicação. Eu só poderia amá-la.

Escrever

Neste mesmo instante estou pedindo que Deus me ajude. Estou precisando. Precisando mais do que a força humana. E estou precisando da minha própria força. Sou forte mas também sou destrutiva. Autodestrutiva. E quem é autodestrutivo também destrói os outros. Estou ferindo muita gente. E Deus tem que vir a mim, já que eu não tenho ido a Ele. Venha, Deus, venha. Mesmo que eu não mereça, venha. Ou talvez os que menos merecem precisem mais.


Deus

Como seria o amor entre duas esperanças? Verde e verde, e depois o mesmo verde, que, de repente, por vibração de verdes, se torna verde. Amor predestinado pelo seu próprio mecanismo aéreo. Mas onde estariam nela as glândulas de seu destino, e as adrenalinas de seu seco e verde interior? Pois era um ser oco, um enxerto de gravetos, simples atração eletiva de linhas verdes. Eu? Eu. Nós? Nós. Nessa magra esperança de pernas altas, que caminharia sobre um seio sem nem sequer acordar o resto do corpo, nessa esperança que não pode ser oca, pois não existe linha oca, nessa esperança a energia atômica sem tragédia se encaminha em silêncio.

Esperança

E ela era a mãe de todos. E se de repente não se ergueu, como um morto se levanta devagar e obriga mudez e terror aos vivos, a aniversariante ficou mais dura na cadeira, e mais alta. Ela era a mãe de todos. E como a presilha a sufocasse, ela era a mãe de todos e, impotente à cadeira, desprezava-os. E olhava-os piscando. Todos aqueles seus filhos e netos e bisnetos que não passavam de carne de seu joelho, pensou de repente como se cuspisse.


Feliz aniversário

Faça com que eu tenha a coragem de te amar,
sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo
Faça com que a solidão não me destrua
Faça com que minha solidão
me sirva de companhia

Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar
Faça com que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo
Receba em teus braços o meu pecado de pensar

Meu Deus, me dê coragem...


O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo, estou pensando." Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia. O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas.

Das vantagens de ser bobo

Faze com que eu tenha caridade por mim mesma, pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana amada para apertar a minha...

Prece

A pretexto de férias com minha família, separamo-nos. Um aperto de mão comovido foi o nosso adeus no aeroporto. Sabíamos que não nos veríamos mais, senão por acaso. Mais que isso: que não queríamos nos rever. E sabíamos também que éramos amigos. Amigos sinceros.

Uma Amizade Sincera


Como em tudo, no escrever também tenho uma espécie de receio de ir longe demais. Que será isso? Por que? Retenho-me, como se retivesse as rédeas de um cavalo que pudesse galopar e me levar Deus sabe onde. Eu me guardo. Por que e para quê? Para o que estou eu me poupando? Eu já tive clara consciência disso quando uma vez escrevi: "é preciso não ter medo de criar". Por que o medo? Medo de conhecer os limites de minha capacidade? Ou medo do aprendiz de feiticeiro que não sabia como parar? Quem sabe, assim como uma mulher que se guarda intocada para dar-se um dia ao amor, talvez eu queira morrer toda inteira para que Deus me tenha toda.

Não soltar os cavalos

Monday, July 16, 2007

ANTON CHEKOV

O amor geralmente é poetizado, decorado com rosas e rouxinois... Nós, russos, decoramos nosso amor com questões sobre ele.
SOBRE O AMOR

EMILE ZOLA

Nos, escritores, somos mais ou menos mentirosos, mas como funcionam nossas mentiras e quais sao os pensamentos por tras delas?... De minha parte ainda acredito que minhas mentiras caminham na direcao da verdade. Aumento os fatos e lhes dou um chute em direcao as estrelas no trampolim da observacao precisa. Entao a verdade aparece nas asas do simbolismo.

Monday, July 09, 2007

CALDERON DE LA BARCA

¿Qué os admira? ¿Qué os espanta,
si fue mi maestro un sueño,
y estoy temiendo, en mis ansias,
que he de despertar y hallarme
otra vez en mi cerrada
prisión? Y cuando no sea,
el soñarlo sólo basta;
pues así llegué a saber
que toda la dicha humana,
en fin, pasa como sueño,
y quiero hoy aprovecharla
el tiempo que me durare,
pidiendo de nuestras faltas
perdón, pues de pechos nobles
es tan propio el perdonarlas.

la vida es sueño

FREDERICO GARCIA LORCA


BELISA. ¡Amor!... ¿quién te ha herido en el pecho? (El Hom­bre se oculta la cara con la capa. Ésta debe ser inmensa y cu­brirle hasta los pies. Abrazándolo.) ¿Quién abrió tus venas para que llenes de sangre mi jardín... ¡Amor! Déjame ver tu rostro por un instante siquiera... ¡Ay!, ¿quién te dio muer­te?... ¿quién?
PERLIMPLÍN. (Descubriéndose.) Tu marido acaba de matar­me con este puñal de esmeraldas. (Enseña el puñal clavado en el pecho.)
BELISA. (Espantada.) ¡Perlimplín!
PERLIMPLÍN. Él salió corriendo por el campo y no le verás más nunca. Me mató porque sabía que te amaba como na­die. Mientras me hería... gritó: ¡Belisa ya tiene un alma!... Acércate.

(Está tendido en el banco.)

BELISA. ¿Pero qué es esto?... ¡Y estás herido de verdad!
PERLIMPLÍN. Perlimplín me mató... ¡Ah, don Perlimplín! Viejo verde, monigote sin fuerzas, tú no podías gozar el cuerpo de Belisa... El cuerpo de Belisa era para músculos jó­venes y labios de ascuas... Yo en cambio amaba tu cuerpo nada más... ¡tu cuerpo!... pero me ha matado... con este ramo ardiente de piedras preciosas.
BELISA. ¿Qué has hecho?
PERLIMPLÍN. (Moribundo.) ¿Entiendes?... Yo soy mi alma y tú eres tu cuerpo... Déjame en este último instante, puesto que tanto me has querido, morir abrazado a él.
BELISA. (Se acerca medio desnuda y lo abraza.) Sí... ¿pero y el joven?... ¿Por qué me has engañado?
PERLIMPLfN. ¿El joven?... (Cierra los ojos.)

(La escena adquiere luz mágica.)

MARCOLFA. (Entrando.) ¡Señora!
BELISA. (Llorando.) ¡Don Perlimplín ha muerto!
MARCOLFA. ¡Lo sabía! Ahora le amortajaremos con el rojo traje juvenil con que paseaba bajo sus mismos balcones.
BELISA. (Llorando.) ¡Nunca creí que fuese tan complicado!
MARCOLFA. Se dio cuenta demasiado tarde. Yo le haré una corona de flores como un sol de mediodía.
BELISA. (Extrañada y en otro mundo.) Perlimplín, ¿qué cosa has hecho, Perlimplín?
MARCOLFA. Belisa, ya eres otra mujer... Estás vestida por la sangre gloriosísima de mi señor.
BELISA. ¿Pero quién era este hombre? ¿Quién era?
MARCOLFA. El hermoso adolescente al que nunca verás el rostro.
BELISA. Sí, sí, Marcolfa, le quiero, le quiero con toda la fuerza de mi carne y de mi alma. Pero ¿dónde está el joven de la capa roja?... Dios mío. ¿Dónde está?
MARCOLFA. Don Perlimplín, duerme tranquilo... ¿La estás oyendo?... Don Perlimplín... ¿la estás oyendo?...

Amor de don Perlimplín con Belisa en su jardín

Wednesday, July 04, 2007

NICOLAU MAQUIAVEL

A natureza dos seres humanos é principesca e para que os principes entendam isso eles precisam de humanidade.
O PRINCIPE

Lygia Fagundes Telles


Minha mae nao usava a palavra suor que era forte demais para o seu vocabulario, ela gostava das belas palavras. Das belas imagens. Delicadamente falava em transpiracao com aquela elegancia em vestir palavras como nos vestia.


VERDE LAGARTO AMARELO

Tuesday, July 03, 2007

RICHARD BACH



Se voce praticar a ficcao por um tempo percebera que os personagens de ficcao as vezes sao mais reais do que os seres humanos.

ILUSOES